Donas-de-casa e domésticas ainda longe da Previdência
Um ano após vigência da lei, governo não sabe se incentivo fiscal estimulou ou não a formalização
Com pouco mais de um ano de vigência, a lei que instituiu estímulo fiscal aos empregadores que assinarem a carteira das trabalhadoras domésticas foi colocada em xeque pelas organizações de mulheres reunidas no Fórum Itinerante Paralelo da Previdência Social. Elas passaram a reivindicar a revisão da legislação, que estaria servindo para rebaixar salários e contribuições previdenciárias em um mercado que se caracteriza pela informalidade.
Apontada pelo governo federal, na época, como importante conquista para os trabalhadores domésticos, a lei sempre foi vista com desconfiança por boa parte das organizações feministas, que achavam ser mais um incentivo aos empregadores do que aos empregados. A Lei 11.324/06 concede dedução no Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) aos patrões que assinarem a carteira de trabalho do seu empregado.
Na semana em que o governo anun-ciou o 2° Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, com a meta de aumentar em 30% o número de empregos domésticos formais, marcando as comemorações oficiais do Dia Internacional da Mulher, as integrantes do fórum foram surpreendidas com a falta de informação.
Apesar da reclamação de entidades como a Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), ninguém possui qualquer levantamento sobre os efeitos práticos da lei, que deveria funcionar como um incentivo para a formalização do trabalho doméstico. Segundo a diretora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), Guacira César de Oliveira, o governo admitiu publicamente que desconhece a eficácia da Lei 11.324, editada em 19 de julho de 2006.
Segundo Guacira, tanto o ministro da Previdência, Luiz Marinho, quanto o do Trabalho, Carlos Lupi, e a titular da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéa Freire, reconheceram que não foi feita qualquer avaliação da lei. No encontro, o governo prometeu usar um convênio dos ministérios com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) para levantar os dados, mesmo que com atraso.
O incentivo fiscal previsto em lei acabou restrito a um empregado por declaração do IRPF, mesmo se ela for conjunta, e com a contribuição previdenciária calculada somente sobre um salário mínimo. "A lei está sendo burlada, principalmente nas capitais, onde a média salarial do trabalhador doméstico supera um salário mínimo. Alguns patrões estão dando baixa nas carteiras, registrando os empregados por um salário mínimo e acertando a diferença por fora", denuncia Eneida Dultra, do Cfemea.
As representantes do fórum solicitaram ao ministro Lupi que encontre alguma alternativa para fiscalizar essas diferenças entre o valor registrado na carteira e o efetivamente pago, porque essa prática rebaixaria a concessão de outros benefícios como o auxílio-doença e a licença-maternidade. Só que as próprias sindicalistas sabem que isso não é tão simples como fiscalizar empresas. Como explica Isabel Freitas, integrante do fórum, o lar é visto constitucionalmente como espaço inviolável. Seria necessário, segundo ela, o reconhecimento legal de que naquele ambiente há uma relação de trabalho passível de fiscalização.